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terça-feira, 8 de maio de 2018

REFLEXÕES AUTOGESTIONÁRIAS 06: DIREITA E ESQUERDA: INIMIGAS DA EMANCIPAÇÃO HUMANA


DIREITA E ESQUERDA: INIMIGAS DA EMANCIPAÇÃO HUMANA

Rubens Vinícius da Silva

Os recentes acontecimentos e casos de violência têm reacendido a velha discussão entre esquerda e direita, assim como entre fascismo/nazismo e antinazismo/antifascismo. Diante deste cenário miserável, o qual demonstra e reafirma a total hegemonia das ideias da classe dominante (ou seja, das ideias dominantes, produzidas pela intelectualidade e a serviço da reprodução desta sociedade) é fundamental realizar uma crítica que supere o aparente e ao mesmo tempo aponte para um projeto realmente revolucionário e emancipador.

Devido ao espaço e também à íntima ligação entre direita e nazismo/fascismo e esquerda e anti-nazismo-fascismo, irei me ater ao significado mais amplo destes dois lados da mesma moeda, que surgem no bojo da primeira revolução burguesa vitoriosa da história, por pura questão de espaço: os que eram a favor do governo revolucionário e suas medidas estavam à direita; os que eram contra (mas não queriam derrubá-los para superá-los, senão para substituí-los) sentavam-se à esquerda.

Pois bem: estes termos há um bom tempo não dão mais conta de explicar a realidade. Servem mais para a confusão e legitimação das relações de produção capitalistas do que o contrário. Os partidos de esquerda têm o mesmo objetivo que os de direita (a conquista do poder estatal), se organizam da mesma forma (burocraticamente, através da relação social dirigentes e dirigidos, onde uma fração de classe específica, a burocracia partidária, exerce o controle, a direção e toma as decisões no seio do partido) e partem de uma ideologia (assim como os partidos de direita) que lhe é fundamental: a ideologia da representação[1], na qual os verdadeiros interesses são omitidos (conquista e manutenção de privilégios, maior proximidade e possibilidade de atuar a serviço dos capitalistas) e falsos interesses são proclamados, a revolução, por exemplo.

O que mudam concretamente são as ideologias políticas para a conquista do poder estatal, as alianças e a base social do eleitorado. Fora isso, esquerda e direita (leia-se suas respectivas burocracias e militantes mais identificados com as práticas, valores e mentalidade desta fração de classe) são inimigas da emancipação humana: têm horror à destruição das relações de exploração, dominação e opressão características da sociedade moderna, uma vez que isso significaria o fim de sua razão de existência, qual seja, controlar, impedir, dirigir e conter toda e qualquer possibilidade de autonomização da luta das classes e grupos sociais desprivilegiados.

No caso dos partidos de esquerda que não defendem as eleições ou sua participação, a única diferença se dá na forma pela qual é feita a luta pela conquista do poder de estado: via golpe ou insurreição, realizado por uma minoria militarmente organizada e que se revela um estado em miniatura. Em ambos os casos (conquista do poder pela via legal ou ilegal), não há a abolição da produção e extração de mais-valor, não há a superação da divisão social do trabalho, da especialização que lhe caracteriza e do trabalho assalariado, bem como não se rompe com a lógica de dirigentes-dirigidos no processo de produção e reprodução dos bens materiais necessários à vida.

 Em suma, quando nos remetemos às experiências históricas de tomada violenta do poder estatal por um partido de vanguarda, que diz representar as classes trabalhadoras e em verdade possui interesses próprios, ou seja, os interesses da burocracia partidária, o que se tem é uma variante do capitalismo privado, onde a burocracia do partido se torna burguesia de estado e as classes subsistem, assim como sua condição de exploração, submissão e dominação. Assim, repete-se (como tragédia e como farsa) um fenômeno nada novo: a luta de classes é substituída pela luta em torno das ideologias. Em todos os países onde os partidos de esquerda tomaram o poder, as relações de produção e as demais relações sociais capitalistas foram mantidas e reforçadas. E o pior: o movimento operário e das demais classes e grupos explorados/oprimidos foi duramente combatido, quer pela cooptação e integração quer pela repressão aberta e violenta.

É urgente que os revolucionários avancem para além das aparências e não se deixem levar pelo cotidiano desumano e pela consciência imediata que dele decorre. Por isso mesmo a necessidade de formação política revolucionária é fundamental. Deste modo, um ponto de partida interessante é estudar as experiências revolucionárias do século passado, muitas das quais foram derrotadas, esmagadas e depois tiveram seu real conteúdo apropriado e deformado pelos próprios partidos de esquerda.

Do contrário não avançamos e as classes privilegiadas se divertem com querelas, conversas e debates improdutivos como fascismo x antifascismo; direita x esquerda; estado máximo x estado mínimo, etc... Neste contexto, a única alternativa possível e que realmente deve ser reforçada é a luta direta e encarniçada contra todos os partidos e demais organizações que reproduzem a sociedade capitalista no seu interior.

A luta cultural contra o capital é também uma luta contra as suas classes auxiliares (burocracia e intelectualidade). Os mais radicais dentre estas, em momentos de amortecimento e estabilidade da luta de classes se apresentam como amigos, defensores, 'representantes' das classes trabalhadoras. Porém, um estudo atento das lutas recentes no país reforça o que as experiências de luta revolucionária derrotadas já evidenciaram.

 Longe de recuperar essa distinção entre esquerda e direita, é preciso criar e se balizar em conceitos que ao mesmo tempo expressem a realidade e contribuam para transformá-la radicalmente. Sem a autonomização da luta proletária, este processo dificilmente pode avançar e ser concretizado, uma vez que o proletariado, devido às suas condições e situação de classe, é o único que pode colocar um fim ao conjunto da sociedade capitalista.

Neste sentido, o combate às organizações burocráticas (no caso da esquerda, partidos e sindicatos; no da direita, além destes, das demais organizações a serviço do capitalismo) deve estar articulado à necessidade da defesa da autogestão das lutas e sua generalização. Somente com a superação da divisão social do trabalho e dos vínculos com a sociedade burguesa, aliados à necessidade de expansão total das organizações não-burocráticas (que não se fundam na relação de dirigentes e dirigidos, essencialmente produto das sociedades de classes) e superação completa da totalidade das relações sociais burguesas é que tanto a esquerda quanto a direita serão enfrentadas, desmascaradas e poderão ser derrotadas, pois significam a manutenção da miséria, da exploração e de tudo o que há de mais inautêntico e desumano na humanidade.




[1] No livro O que são partidos políticos?, Nildo Viana desenvolve melhor a discussão entre a ideologia da representação e os verdadeiros interesses e objetivos da burocracia partidária: http://2012.nildoviana.com/wp/wp-content/uploads/2012/09/O-Que-Sao-Partidos-Politicos-Nildo-Viana.pdf

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