TEXTOS E DEBATES
DITADURA, DEMOCRACIA OU AUTOGESTÃO SOCIAL?
Lucas Maia
Com toda esta babel em torno da questão da ditadura militar no Brasil, se ela existiu ou não, a consciência e a luta para a superação do capital e do estado recuou. Ao invés de se apontar o fim do estado, defende-se o estado democrático. Ao invés de se lutar pela constituição de outra sociedade (que eliminaria as ditaduras), luta-se para defender a democracia. Esquece-se com isto que a democracia é somente uma das formas de regime político do estado moderno, portanto, do capital.
Abandona-se assim a luta contra o capital e contra o estado em nome da defesa da democracia. Os setores mais radicalizados, o bloco revolucionário, se entram neste discurso, devem fazer alianças com liberais, social-democratas e toda a esquerda oficial que defende o estado democrático de direito.
Obviamente que lutar em um estado democrático é menos perigoso que em um estado ditatorial, pois, nas ditaduras (civis ou militares), a repressão estatal é generalizada e tende a perseguir todos os espectros políticos, organizações, indivíduos que se opõem ao poder estabelecido. As chamadas garantias democráticas (direito de organização, liberdade de expressão etc.) são cassadas. Isto não impede, contudo, que a luta na democracia, quando excede o tolerado pelo estado democrático de direito, torne este mesmo estado democrático tão abusivo quanto um estado ditatorial.
Além disto, as revoluções do século XX provam que elas emergem em qualquer tipo de regime político. Por exemplo, as revoluções russa (1905 e 1917) emergiram contra um estado ditatorial. O mesmo vale, por exemplo, para a revolução portuguesa de 1975, que surge dentro da ditadura de Salazar. Também, nos regimes democráticos, ocorreram importantes processos revolucionários: Revolução alemã de 1918 a 1921, o Maio de 1968 na França. Mesmo dentro do chamado “socialismo real”, na verdade um capitalismo de estado, emergiram importantes processos revolucionários contra as ditaduras dos estados “socialistas”: Hungria em 1956 e 1968, Polônia na década de 1980, etc.
Resta, portanto, colocar à frente da reflexão e da luta, não os interesses deste ou daquele partido, deste ou daquele regime político (ditadura ou democracia?), deste ou daquele grupo identitário, mas os interesses de classe (o das classes desprivilegiadas em geral e sobretudo do proletariado). Só assim superaremos a sinuca de bico ao demonstrar que para o proletariado, lutar contra a ditadura não implica em apoiar a democracia, pois o que está em jogo é a superação do capital e do estado (logo, de seus regimes políticos também). O que está em pauta, pois, é a constituição de uma nova sociedade radicalmente distinta da existente, fundada na autogestão social.
Ou é isto ou se ficará eternamente vítima das chantagens da classe dominante e suas classes auxiliares (burocracia e intelectualidade).
Esse texto do Lucas Maia contribui para pôr em questão o ilusionismo da democracia representativa eleitoral moldada conforme os interesses classistas da burguesia. Certamente que se a luta das classes exploradas e oprimidas contra a exploração e a opressão capitalistas não ameaçasse o domínio da burguesia, esta não substituiria a democracia por regimes ditatoriais. A burguesia não possui nenhum apelo dogmático à democracia. Mas há classes privilegiadas que parecem não perceber isso. Sequer percebem que os regimes ditatoriais são produzidos pela própria burguesia e grupos aliados dela.
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