segunda-feira, 10 de agosto de 2020

CONTRA OS PARTIDOS E SINDICATOS


CONTRA OS PARTIDOS E SINDICATOS


Rubens Vinícius da Silva


Escreveu Marx (1977, p. 3, itálico no original) na Introdução à crítica da filosofia do direito de Hegel [1843]: "Dirigidos por nossos pastores, encontramo-nos apenas uma vez em companhia da liberdade: no dia do seu enterro". Qual a relação entre este fragmento e o modo como os partidos e sindicatos buscam se relacionar com as classes inferiores e setores contestadores da sociedade moderna?

A resposta a tal questionamento nos remete ao seguinte: nunca é demais lembrar que todos os burocratas de partidos e sindicatos são "pelegos[1]", sejam eles ocupantes ou aspirantes, conservadores ou progressistas. A burocratização e mercantilização destas duas formas organizacionais é algo irreversível; a relação entre dirigentes e dirigidos que as fundamenta é uma das relações sociais fulcrais das sociedades classistas.

Os seus interesses enquanto fração de classe auxiliar da burguesia (a classe dominante no capitalismo) consistem em impedir que as classes inferiores superem estas formas burocráticas de organização, que ironicamente foram criadas pela classe operária e há mais de um século servem para a reprodução e consolidação do capitalismo. A história do movimento operário está repleta de exemplos onde os partidos e sindicatos foram os principais agentes da contrarrevolução, ao lado da classe capitalista e das suas classes auxiliares.

Dentre outras formas, a miséria contemporânea do bloco progressista[2] se manifesta no desespero eleitoral e na necessidade de controlar, amortecer ou cooptar as formas de auto-organização das classes inferiores e setores contestadores da sociedade capitalista. Do mesmo modo, pode ser observada na busca incessante por legitimar a necessidade da organização sindical (seja nas direções ou nas patéticas "oposições de luta", que só servem como justificativa para ascender à burocracia sindical e manter a apatia e passividade das "bases"), a qual também há mais de um século se revela uma forma de organização antagônica à luta pela autoemancipação humana.

Ambas as organizações são fundadas numa rígida e complexa divisão social, reproduzindo o capitalismo no seu interior. No interior destas organizações emerge um conjunto de funcionários especializados, os quais passam a possuir interesses próprios, vinculados à sua autorreprodução enquanto fração da burocracia. Ao lado disso, os burocratas de partidos e de sindicatos promovem um processo de autovaloração, enaltecendo suas ações com o fim de justificar sua existência. Tal processo caminha em conjunto com o processo de simulação-dissimulação: os burocratas partidários e sindicais do bloco progressista dizer representar os interesses das classes trabalhadoras, mas na verdade estão perseguindo seus interesses enquanto fração de classe auxiliar da burguesia. Desta forma, podemos afirmar que os partidos são estados em potencial e os sindicatos são organizados nos moldes da democracia burguesa, uma das mais sutis ideologias e formas de dominação de classe.

Os partidos políticos só têm um objetivo: tomar o poder e exercê-lo. Os sindicatos possuem horror às relações de produção comunistas, pois a autogestão social significa o fim de sua existência. O proletariado revolucionário e seus aliados têm interesses maiores e mais urgentes: a sua libertação, na forma de criação, generalização e articulação da autogestão de suas lutas, determinação fundamental para a autoemancipação humana.


Referências

MARX, Karl. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel – Introdução. São Paulo: Editorial Grijalbo, 1977.

SILVA, José Santana.  Sindicalismo: da expectativa revolucionária à conformação burocrática. Goiânia: Edições Enfrentamento, 2020.

VIANA, Nildo. Blocos sociais e lutas de classes. Revista Enfrentamento, ano 10, n. 17, jan/jul. 2015. Disponível em: https://redelp.net/revistas/index.php/enf/article/view/960/830



[1] Na tradição do sindicalismo brasileiro, termo que caracteriza as direções sindicais que explicitamente buscam conciliar os interesses entre a classe capitalista e determinada fração das classes trabalhadores. Sobre o processo de burocratização do sindicalismo, que sepultou de modo inevitável quaisquer expectativas revolucionárias a respeito desta organização, consultar Silva (2020).

[2] Os blocos sociais são as formas mais organizadas, conscientes e ativas das classes sociais (não devendo ser confundidos com estas), no caso das classes fundamentais (burguesia e proletariado), ou de seus setores mais autonomizados, no caso da burocracia e seus aliados. O bloco progressista reúne frações da burocracia partidária e sindical popularmente conhecidos como “de esquerda”, ou seja, os setores destas frações de classe que dizem “representar” os interesses do proletariado e demais classes inferiores. Acerca dos blocos sociais, conferir o texto Blocos sociais e luta de classes, de Nildo Viana, publicado na Revista Enfrentamento, ano 10, n. 17, jan/jul. 2015. Disponível em: https://redelp.net/revistas/index.php/enf/article/view/960/830.

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