terça-feira, 11 de outubro de 2016
domingo, 2 de outubro de 2016
POR QUAL MOTIVO O MOVAUT NÃO VAI ADERIR À “ARTICULAÇÃO DO BOICOTE À FARSA ELEITORAL”?
POR QUAL MOTIVO O MOVAUT NÃO VAI ADERIR À
“ARTICULAÇÃO DO BOICOTE À FARSA ELEITORAL”?
O Movaut agradece o convite dos
responsáveis pela proposta de uma “Articulação do Boicote à Farsa Eleitoral”
para estar participando dessa iniciativa e considera que a ideia em geral é
positiva. No entanto, a proposta traz em si alguns problemas e por isso o
Movaut não irá compor tal articulação e vamos esclarecer, a seguir, as razões
pelas quais recusamos o referido convite.
1.
Como se
constrói uma articulação de coletivos revolucionários.
O Movaut sempre
tentou articular com diversos coletivos (anarquistas, autonomistas,
independentes, etc.) e considera fundamental a articulação entre as
organizações e indivíduos revolucionários e por isso já propôs a formação de
uma federação a nível nacional a alguns coletivos e retomou essa proposta
algumas vezes, sem grandes resultados, pois sempre as divergências entre os
coletivos e as distintas concepções foram obstáculos que impediam tal processo.
O Movaut considera que o fortalecimento do Bloco Revolucionário (que é um
conceito que expressa uma determinada realidade, no caso, o conjunto das
forças, coletivos, ideias, indivíduos que são expressão de uma consciência
revolucionária e não organização ou qualquer outra coisa, apesar dos
plagiadores do Movaut confundirem os termos e deformarem o seu real significado,
desde a UNIPA até o PCB) fundamental.
Contudo, também
considera que existem setores no bloco revolucionário (oposto ao bloco
dominante/conservador e ao bloco progressista, este último dominado pelos
“partidos de esquerda”) que são ambíguos e que assumem ideias e práticas
equivocadas, gerando assim um obstáculo interno para o avanço desse bloco e,
por conseguinte, sua contribuição à luta do proletariado e demais classes sociais
desprivilegiadas. As divergências e contradições, tanto nesse nível, que tem
maior importância, quanto em outros, incluindo nesse último caso idolatria por
doutrinas ou pensadores do passado, dificultam esse processo e uma maior
eficácia do bloco revolucionário na luta de classes.
Isso se
manifesta na proposta de articulação entre os coletivos que se posicionam
contra o processo eleitoral. Um dos problemas dessa proposta é o da linguagem.
Se se quer unir todos que combatem o processo eleitoral numa perspectiva
revolucionária e não existe o consenso na forma de fazer isso – voto nulo ou
abstenção, por exemplo, então seria necessário que o nome da articulação
possibilitasse a inclusão de todas as concepções. Isso se reproduz, com menos
importância, no uso de termos como “massas”, “povo”, “poder popular”, etc.
A articulação de
coletivos revolucionários não pode ser algo que alguém propõe (de quem foi a
ideia original? Com quais objetivos? Quem foi convidado e participa? Quais são
suas concepções, etc.?) sem uma reflexão antes e durante sua construção. Uma
articulação de coletivos revolucionários em torno de uma questão pontual é algo
problemático. O processo eleitoral deve ser combatido e nós propomos o voto
nulo autogestionário, mas não pensamos que uma articulação de coletivos
revolucionários possa se contentar com uma questão parcial e limitada como no
caso de um posicionamento e ação diante das eleições. É preciso que se discuta
qual é a importância disso para a luta revolucionária e qual é o projeto alternativo,
pois não basta lutar contra o processo eleitoral, é fundamental apresentar uma
alternativa, que, no caso do Movaut, é a autogestão social. Nem todos defendem
a autogestão social (pelo menos não com este nome), o que não impede uso de
termos mais genéricos que englobe as concepções da sociedade futura.
Assim,
consideramos que a construção inicial já foi problemática, pois lança a ideia
da articulação e suas ideias básicas e em nenhum momento chama para a reflexão
e debate (inclusive sobre a concepção e os planos de ação que já estão
presentes na carta-convite). Dito isto, passemos para alguns questionamentos
mais concretos e que estão intimamente relacionados com tudo que foi dito até
agora.
2) A fragmentação só pode ser superada a
partir de um projeto em comum e não de ações pontuais em comum e nem todos que
se dizem revolucionários deveriam ser convidados.
Segundo a
carta-convite da Articulação, a unificação daqueles que defendem o boicote
eleitoral é “um passo importante para tentar superar a fragmentação dos setores
combativos no país diante da ofensiva dos de cima (sic)”. A fragmentação
aludida na carta-convite é um produto social e histórico que tem sua raiz no
problema da concepção política, que é ligada a luta de classes. Logo, ela não
pode ser superada deixando de lado o debate sobre concepção política e união
não refletida para uma ação pontual. Isso seria no máximo a substituição de
ações de diversos indivíduos e coletivos isolados por uma reunião em atos e um
texto, que nada unificaria e não serviria para a superação da fragmentação, já
que sua razão de ser não seria trabalhada.
Derivado disso o
Movaut discorda de qualquer articulação que não se proponha a refletir sobre a
concepção política e, por conseguinte, aceite no seu interior todos que se
“dizem” revolucionários. As diferenças de concepções políticas, em muitos
casos, são derivadas de ligações com tradições políticas, pensadores,
influências culturais, etc. Em outras, são mais profundas, expressam distintas
perspectivas de classe. O bolchevismo sempre se autodeclarou revolucionário. No
fundo, no entanto, é contrarrevolucionário e ao invés de ser uma expressão do
proletariado, é expressão da burocracia (em seu setor mais radicalizado). Mesmo
parecendo ser revolucionário, assumindo radicalidade, incluindo o ativismo que
muitos gostam, e até combatendo as eleições, o bolchevismo é contrarrevolucionário
e visa a conquista do poder estatal, sendo uma burocracia partidária que quer
se fundir com a burocracia estatal. Historicamente, o que ele produziu foi o
capitalismo de estado. Portanto, a posição do Movaut frente ao bolchevismo é de
luta e a razão disso é seu caráter de classe, burocrático, e seu significado
negativo para a luta proletária (e para o bloco revolucionário, que ele sempre
combate estando no poder estatal e não seria necessário recordar a Revolução
Russa e outros processos históricos para aprender com as experiências
históricas). Nesse sentido, o Movaut é antibolchevique, o que significa ser
antagônico a todas as concepções bolchevistas e seus derivados e variações.
Logo, o Movaut é antimaoísta (e até o maoísmo esquerdista que surgiu no final
dos anos 1960 com o processo de intensificação da luta de classes dessa época e
com a chamada “revolução cultural chinesa”, tem limites que nos parecem
intransponíveis).
A Carta-Convite
não esclarece quem faz parte dessa articulação, mas percebemos que grupos
bolchevistas estão presentes e isso é um grave problema e o caráter proletário
de tal articulação se vê comprometido. O Movaut não faz alianças e atua junto
com correntes bolchevistas em uma organização, frente, etc. Nos movimentos
sociais, no movimento operário, etc., é possível andar lado ao lado, mas por
causa de ser algo mais amplo e não como aliados e sim como manifestando
posições distintas, que podem até concordar em uma ou outra coisa pontual, mas
no geral e no essencial é antagônico e isso vai, fatalmente, se manifestar nas
lutas concretas. Não se trata de questões pessoais, inclusive alguns indivíduos
bolchevistas podem ser pessoas honestas e que acreditam e lutam sinceramente
pela transformação social, mas suas concepções e práticas derivadas são um
obstáculo e a crítica que realizamos serve não só para as lutas de classes em
geral como também para que estes indivíduos, mantendo sua honestidade e
sinceridade, avancem e abandonem suas posições equivocadas e não-proletárias.
Curiosamente, há
vários setores dentro do anarquismo que preferem se aliar ao maoísmo e outras
correntes bolchevistas, que possuem toda uma história não só de crítica
(limitada e equivocada na maioria dos casos) ao anarquismo como também o
combate ao mesmo nas experiências históricas de tentativas de revoluções proletárias,
do que com o Movaut. As razões disso são várias e uma delas é o voluntarismo e
ativismo – o que é um elemento presente na Carta-Convite, pois é uma chamada à
ação numa questão pontual que nunca aponta para a reflexão. Isso é extremamente
problemático e deixa certos setores do anarquismo refém de outras correntes
que, mesmo que não façam reflexões nas articulações em conjunto, possuem toda
uma concepção a respeito do processo e de seus objetivos. O anarquismo tem o
dever revolucionário de refletir sobre os efeitos de suas decisões e ações nas
lutas de classes e evitar reforçar aqueles que expressam interesses de outras
classes que não o proletariado e demais classes desprivilegiadas. Ao não fazer
isso, certos setores anarquistas tendem a se tornar bucha de canhão de certos
setores bolchevistas. O Movaut é antipartidário, seja partidos legalizados ou
não, mas considera que o combate aos partidos não é através da violência, de
ataque a indivíduos, etc. A recusa dos partidos políticos é por causa de seu
caráter e a forma de combatê-los é mostrar para a população o que são e assim
torná-los inúteis e ineficazes.
Em síntese, o
Movaut não se alia e não lança manifesto, bem como não realiza ações em
conjunto, com correntes bolchevistas e esse é um dos motivos pelos quais não
vai aderir à Articulação em torno do processo eleitoral.
3) A falta de reflexão revela a imaturidade
política da proposta apresentada e somente um chamado para um debate coletivo é
que poderia gerar uma verdadeira articulação revolucionária.
A Carta-Convite,
como já colocamos, mostra um descaso com a reflexão sobre a articulação que se
pretende construir e com o que se propõe mais concretamente. Isso mostra a
imaturidade política que se manifesta de forma mais cabal na ideia de “convocar
e coordenar onde for possível ações contra as sedes dos partidos e candidatos”.
Não deixa de ser curioso que setores que, durante as manifestações de junho de
2013, compraram o discurso do bloco progressista (especialmente de certos
intelectuais e partidos de esquerda) segundo o qual a recusa dos partidos
políticos seria manifestações de “fascismo”, agora apontem para “ações contra
as sedes dos partidos e candidatos”.
Que sentido tem
isso? O que isso contribui com a luta revolucionária? O que isso colabora com o
desenvolvimento da consciência dos trabalhadores? Em absolutamente nada e ainda
abre espaço para a criminalização e repressão aos componentes do bloco
revolucionário e aos progressistas extremistas (os bolchevistas que estão
envolvidos nessa articulação). Isso está envolvido numa ideia equivocada de
radicalidade, que a confunde com violência. O processo de transformação social
conviverá com atos de violência de todos os lados, mas isso não é por gostarmos
e querermos isso. Então não devemos transformar o “mal necessário” em
“virtude”. Ao invés de ações contra sedes de partidos e candidatos, é muito
mais politizador e revolucionário realizar a propaganda que esclareça o que são
os partidos políticos, seu caráter burocrático e contrarrevolucionário, e
desmascarar os candidatos. Esse tipo de proposta revela, novamente, o baixo
grau de reflexão e isso pode trazer consequências nefastas para os coletivos e
até mesmo para os indivíduos envolvidos nessa articulação.
A posição do Movaut
O Movaut, tendo
em vista estes pontos levantados, não participará de tal “Articulação do
Boicote à Farsa Eleitoral”. O Movaut defende uma maior articulação dos
coletivos que são integrantes do bloco revolucionário existente no Brasil e
poderá desenvolver atividades conjuntas e realizar diversas ações e
articulações com tais coletivos, desde que não haja correntes bolchevistas e seja
algo que, por falta de reflexão ou qualquer outro motivo, não expresse a perspectiva do proletariado.
Acreditamos que a posição mais adequada diante do processo
eleitoral é a do voto nulo autogestionário. Os motivos fundamentais para isso
são: o voto nulo autogestionário une protesto e deslegitimação da democracia
representativa com a luta vinculada entre a negação das instituições burguesas
e o projeto de transformação social autogestionário; e, por outro lado, o voto
nulo se diferencia por não ser mero abstencionismo (o chamado boicote
eleitoral) e sim um uso político das brechas do processo eleitoral, buscando
assim trazer para a contagem oficial o descontentamento popular com as
instituições e políticos, burgueses ou falsos porta-vozes dos trabalhadores.
É por isso que o
Movaut continuará a lutar pelo voto nulo
autogestionário e poderá articular e trabalhar junto com outros coletivos
que estão no espectro do bloco revolucionário e não fará isso com correntes que
estão no espectro do bloco progressista, por mais extremista que seja. Desta
forma, o Movaut está sempre disposto a realizar articulações e luta conjunta
com demais setores do bloco
revolucionário, desde que no interior da perspectiva do proletariado.
segunda-feira, 15 de agosto de 2016
quarta-feira, 30 de março de 2016
Para além da polarização burguesa! Pela alternativa autogestionária!
Para além da polarização burguesa!
Pela alternativa autogestionária!
O
termo crise é recorrente na história de países subordinados como o Brasil.
Crise econômica ou financeira, social, política e até “moral” (corrupção), como
ressaltam alguns. O atual cenário nacional parece conjugar todas elas.
Geralmente, as crises são encaradas como fenômenos que perturbam a rotina da
vida cotidiana. Mas, no capitalismo, elas não chegam a se configurar como
situações extraordinárias ou totalmente imprevisíveis, após séculos de
ocorrências. Na verdade, verifica-se uma tendência a se tornarem cada vez mais
frequentes, à medida que as possibilidades de expansão do espaço e dos meios de
acumulação de capital se tornam mais restritas. Em qualquer sociedade e época
em que ocorram os trabalhadores são os que mais sofrem com seus efeitos, mas
nos países capitalistas subordinados as consequências são piores.
O fim do ciclo de
expansão capitalista
Como explicar a atual crise brasileira e
seus desdobramentos políticos? Em primeiro lugar, embora as crises econômicas
ou mais restritamente financeiras sejam intrínsecas ao capitalismo, são raras
as que possuem potencial para levar o modo capitalista de produção ao colapso
definitivo. No capitalismo, podemos identificar dois tipos de crise: um é
gerado pela oferta excessiva de mercadorias, que o mercado não consegue
absorver devido à baixa renda da maioria dos consumidores, principalmente dos
trabalhadores, e o outro resulta da crescente incorporação de tecnologias mais
avançadas (trabalho morto ou capital constante) no processo produtivo, tendo
como contrapartida a dispensa de força de trabalho (trabalho vivo ou capital
variável), levando a uma queda na taxa de lucro, ao ponto de zerar. Em ambos os
casos, as crises são motivadas pela competição entre os capitalistas, que,
apesar de defenderem a liberdade de iniciativa e a livre concorrência (tal como
na ideologia neoliberal), cada um tenta eliminar os demais, buscando
monopolizar o mercado.
Embora o capitalismo se desenvolva na forma
de regimes de acumulação, no percurso de cada regime ocorrem ciclos de
desenvolvimento, incluindo os de expansão da acumulação, ideologicamente
chamados pelos economistas de “períodos de crescimento econômico”. À medida que
se sucederam os regimes de acumulação, as atribuições do Estado na garantia das
condições necessárias à acumulação de capital foram se ampliando, ao ponto de
se tornar imprescindível, não só à regularização das relações entre o capital e
a força de trabalho, além do seu controle disciplinar por meio da repressão,
mas também no financiamento das atividades econômicas. Atualmente, o
capitalismo se encontra no regime de acumulação integral, iniciado por volta da
década de 1980. Como nos demais, o Brasil se insere nesta fase na condição de
país subordinado.
Entre 2004 e 2013, o capitalismo brasileiro
passou por um ciclo de expansão com taxas de crescimento do produto interno
bruto – PIB – cujos índices oficiais positivos variaram entre 1,9% e 7,5%,
tendo sofrido uma queda de 0,1% em 2009 e atingido uma média anual de 4,04%
nesses dez anos. Nesse período, o consumo das classes trabalhadoras apresentou
um certo crescimento, sustentado por uma relativa estabilidade financeira, com
índice médio de inflação anual de 7,1% (índice de preço ao consumidor amplo –
IPCA – medido pelo IBGE), redução do desemprego e, mais importante, ampliação
do crédito com o consequente aumento do endividamento de importante parcela dos
trabalhadores.
Esse inusitado aumento do consumo das
classes desprivilegiadas, que contou ainda com políticas de distribuição de
renda estatal a famílias de trabalhadores mais pobres, por meio de programas
sociais como “Bolsa Família”, além do incremento do consumismo das classes
privilegiadas, serviu de estímulo para investimentos de capitalistas de origem
nacional, geralmente financiados por bancos estatais (Banco de Desenvolvimento
Econômico e Social, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil), e de
capitalistas estrangeiros. A maior parte do investimento destes últimos em
atividades produtivas se destina à indústria de bens de consumo duráveis,
particularmente ao setor automobilístico. Entretanto, a maior parte do capital
externo é aplicada na especulação, seja em ações de empresas nacionais seja em
títulos da dívida estatal. Os capitalistas nacionais investiram,
principalmente, no setor imobiliário e no comércio.
A ampliação do mercado interno na
promoção do desenvolvimento da acumulação de capital derivou de duas situações:
inicialmente, o aumento de recursos financeiros sob controle do Estado em
decorrência da estabilidade da moeda nacional, o real, e da entrada de dólares
advindos das exportações de produtos primários ou commodities (minérios e produtos agropecuários); num segundo momento,
a crise financeira internacional, que se iniciou no setor imobiliário da
economia norte-americana e se expandiu para vários países europeus, com
restrições às exportações de bens de consumo nacionais.
Conforme já indicado, o Estado teve
papel principal no estímulo à expansão da acumulação de capital no último
período. Porém, os meios utilizados (créditos e redução de alguns tributos como
o imposto sobre produtos industrializados – IPI) se esgotaram, a partir de
2014, devido aos crescentes déficits
orçamentários e ao aumento da dívida estatal junto a credores privados
(compradores de títulos da dívida pública). Enquanto
durou essa curta fase de expansão, os capitalistas, mais do que os novos
consumidores, fizeram a festa, apesar das expectativas de que poderia não durar
por muito tempo. É importante assinalar que a indústria nacional de bens de
consumo não foi a maior beneficiária da expansão do mercado interno. Algumas
análises afirmam que ocorreu, ao contrário, um recuo da produção industrial. O
aumento do consumo foi satisfeito, em parte, com produtos importados,
principalmente da China, que era também a maior compradora dos produtos
primários brasileiros.
Embora o governo petista encabeçado por
Dilma Rousseff tenha demorado a admitir que o Estado já não podia mais oferecer
os meios para manter o crescimento do PIB, as deficiências financeiras foram se
tornando cada vez mais evidentes. Nessas
circunstâncias, a diminuição do crédito e o crescente endividamento dos
trabalhadores provocaram uma rápida redução do consumo e aumento da
inadimplência. O que demonstra que, ao contrário da aparência, o tal
crescimento econômico não levou a um aumento real da capacidade de consumo dos
trabalhadores. Manteve, como se verifica em todo ciclo de expansão da
acumulação de capital, a riqueza concentrada. Com isso, o pequeno e o médio
capital entraram em dificuldade para se manter. Instalou-se a recessão.
Esgotado
o ciclo de expansão, os pequenos proprietários e certos setores da burguesia,
além de setores das classes privilegiadas não burguesas, inadequadamente
denominadas “classes médias” (burocracia ou administradores empresariais,
profissionais autônomos, dentre outros), passaram a manifestar seu
inconformismo, primeiro, protestando contra o governo no espaço doméstico
(“panelaços”), em seguida nos espaços públicos, realizando algumas
manifestações com grande quantidade de pessoas (com presença de diversas
classes sociais), tal como a de 13 de março. Mas, os
setores mais organizados e conscientes desse grupo, ao invés de explicitar para
todo o restante da sociedade os reais motivos do seu inconformismo, se apegam
às denúncias contra a corrupção, criticando a incompetência do governo e, no
caso de sua ala mais reacionária, a sua suposta orientação “socialista” ou
“comunista”. Com as sucessivas revelações de esquemas de corrupção (“mensalão”
e Petrobrás) constituídos por membros dos partidos que compõem a sustentação
parlamentar do governo, em parceria com banqueiros e empresários,
principalmente da construção civil, os inconformados consolidaram as críticas
ao governo e passaram a defender de modo mais enfático o fim do mandato da
atual presidente.
A polarização burguesa:
Governistas e Antigovernistas
Nesse contexto, a chamada crise política
se instaura. No fundo, desde as manifestações de 2013 vem ocorrendo um processo
conjunto de deterioração da governabilidade burguesa expressa no governo Dilma.
A crise de legitimidade da democracia burguesa acaba se confundindo com a crise
de legitimidade deste governo. Uma parcela cada vez mais ampla da população
mostra seu descontentamento com o governo. A emergência de novas forças
políticas, reacionárias, ao lado dos partidos e posições mais estáveis no
cenário político nacional, e a contestação espontânea da população se juntam às
disputas político-partidárias pelo poder. O bloco dominante, expressão política
mais organizada e consciente da classe capitalista e contando com apoio de
parte das classes auxiliares, manteve suas disputas internas num grau de
moderação que começou a ser rompido principalmente a partir de 2013.
As manifestações populares daquele ano
permitiram a ruptura do falso consenso existente, tanto por mostrar que o
governo Dilma não tinha uma base de apoio tão forte quanto se pensava, além de
mostrar o descontentamento de grande parte da população, aliado à dificuldade
crescente da acumulação de capital, o que vai se aprofundando nos anos
seguintes. O resultado das eleições de 2014 mostrou um enfraquecimento da
aliança estabelecida em torno do PT – Partido dos Trabalhadores – gerando uma
forte ala oposicionista no bloco dominante, e que vai se fortalecer nos meses
seguintes. As denúncias de corrupção e o pedido de impeachment acirraram ainda mais os ânimos dos dois campos do bloco
dominante em disputa pelo poder estatal.
A incapacidade do governo em resolver o problema
da crise financeira e o aprofundamento desta acabam fortalecendo a ala
oposicionista do bloco dominante. Isso vai provocando um isolamento cada vez
maior do governo, que perde aliados, incluindo setores do capital que antes lhe
apoiavam, perde popularidade, perde até mesmo setores da ala governista que
passam para a oposição. O isolamento progressivo do governo Dilma convive com a
rearticulação do bloco dominante, que concentra na ala oposicionista o
deslocamento das forças. A burocracia estatutária (aparato jurídico e
repressivo), setores do capital, PMDB e outros partidos que eram da base
governista, acabam passando para o lado oposicionista. Os meios oligopolistas
de comunicação avançam no sentido de deteriorar a já abalada popularidade do
governo e as manifestações de 13 de março só colocou nas ruas uma pequena parte
dos descontentes. As manobras palacianas para se manter no poder a qualquer
custo ficam cada vez mais restritas e o processo de impeachment ganha força.
É nesse contexto que emerge a nova
manobra governista: uma vez que perde cada vez mais apoio no interior do bloco
dominante apela para apoio popular – que dificilmente conseguirá em grande
escala – e apoio do bloco progressista,
os ditos “partidos de esquerda” e para uma maior mobilização dos setores
cooptados e aparelhados, desde as velhas centrais sindicais até os grupos
atrelados às políticas de identidade. Para efetivar isso, usa o estratagema
discursivo de propagar o combate ao “golpismo” e “fascismo”. Esse estratagema
discursivo busca aglutinar os setores progressistas da sociedade em apoio ao
governo e desviar a atenção da população da crise financeira, corrupção e
impeachment para um fantasma político inventado. A estratégia petista é ambígua
por estar no governo e não poder “assustar” a classe dominante, no contexto de
uma crise financeira, e ainda precisar apoio popular sem ter maior presença no
interior das classes desprivilegiadas e para isso precisar do bloco
progressista (especialmente os partidos de “esquerda”), que exige determinadas políticas
que assustam a burguesia. O discurso do golpe e fascismo disfarça um pouco o
caráter conservador da ala governista, mas o referido bloco também não tem
muita força, fornecendo um apoio modesto. Os setores da juventude e
intelectualidade que podem ser ponto de apoio, além dos já alinhados, também
não é expressivo, pois o bloco revolucionário e a maior parte das classes
desprivilegiadas também estão descontentes com o atual estado de coisas.
A polarização burguesa, ou seja, no
interior do bloco dominante, que aparece sob a forma de PT versus PSDB e outras forças políticas apenas mantém a discussão no
nível estatal e institucional. O PT busca transformar essa polarização entre
“direita” e “esquerda” (assim como setores da ala oposicionista), inclusive
gerando uma polarização secundária entre moralismo
conservador (mais forte no âmbito religioso, com força parlamentar e
social) e moralismo progressista
(oriundo do multiculturalismo e política de identidades). Assim, o
institucionalismo e o comportamentalismo servem para dividir a sociedade
brasileira em dois grandes grupos, no fundo, duas alas do bloco dominante que
expressam os interesses do capital. Essas duas polarizações, em que se disputam
quem vai assumir o poder e ditar a moral, no interior do capitalismo, exclui a
maioria absoluta da população, as classes desprivilegiadas, bem como a classe
revolucionária de nossa época, o proletariado. Da mesma forma, isola as
expressões políticas mais organizadas e coerentes do mesmo, o bloco
revolucionário. No entanto, as classes
desprivilegiadas continuam existindo, assim como sua insatisfação, bem como o
bloco revolucionário, apesar de suas debilidades.
A alternativa
autogestionária
É nesse contexto que o Movaut e o bloco
revolucionário devem atuar. Um dos elementos fundamentais dessa atuação é
romper com a polarização burguesa entre governistas e oposicionistas no âmbito
da política institucional. Isso pressupõe manter a crítica a ambos os lados e
aos que se aliam a um dos dois, bem como aos setores progressistas. Tanto faz
se eles usam a roupa vermelha como disfarce, pois sua alma é burguesa. Além
disso, é necessário realizar a crítica da ala semiproletária e ambígua dentro
do próprio bloco revolucionário. Não é possível omitir a crítica a setores que
se dizem “anarquistas”, “autonomistas”, entre outros nomes bonitos, mas que
apoiam governos que promovem sistematicamente políticas contra os trabalhadores
(corrosão de direitos trabalhistas e sociais) e contra o próprio bloco
revolucionário (vide lei antiterrorismo). É
fundamental, nessa crítica, deixar claro a necessidade de uma política
proletária, anti-institucional, autônoma e independente. Nem com os
governistas, nem com os oposicionistas! Contra a polarização burguesa e por uma
nova polarização, de classe, ou seja, trabalhadores contra burguesia, tanto faz
se sua máscara é vermelha ou verde-amarela.
Nesse sentido, é necessário ampliar a
luta cultural e as ações junto às classes desprivilegiadas. A superação da polarização burguesa passa
por um maior desenvolvimento da consciência e formas de auto-organização da
população, especialmente do proletariado e trabalhadores desempregados e
precarizados, bem como com os setores mais avançados da juventude. É
preciso colocar para a população a possibilidade de superar tal polarização e
para isso é fundamental deixar claro a existência da alternativa autogestionária.
Reforçar a luta dos trabalhadores e
apontar para sua autonomização e abandono das ilusões reformistas,
progressistas, governistas. O rompimento
com as organizações burocráticas (Estado, partidos, sindicatos, entre outras) e
o caminho da auto-organização, autoformação, luta direta, luta cultural. O
chamado à greve autônoma e independente deve ser a palavra de ordem dos
revolucionários de hoje, pois é somente na construção do movimento grevista que
as classes trabalhadoras elaboram suas táticas de ação, criam seus próprios
discursos, desenvolvem, portanto, sua consciência.
Nesse contexto, o Movaut declara que
somente a luta pela autogestão social tem sentido e que sua possibilidade está
dada, porquanto as explosões proletárias são imprevisíveis, mas geralmente
ocorrem em épocas de crise, distúrbios, impasses, como a que vive atualmente a
sociedade brasileira. No atual momento, a ampliação da luta sob as formas acima
elencadas é o principal modo de contribuir com a formação da alternativa
autogestionária como algo concreto e real.
Movimento
Autogestionário
Março
de 2016
Nem partidos, nem sindicatos!
Auto-organização já!!
Nem PT, nem PSDB! Não à via
parlamentar!!
Pela ação autônoma das classes
trabalhadoras!!
Construir a greve geral!!!
segunda-feira, 21 de março de 2016
A ANT LANÇA COMUNICADO SOBRE CRISE ATUAL
COMUNICADO ANT 02:
A CRISE ATUAL E COMO SAIR DELA:
CONTRA O CAPITAL RUMO À AUTONOMIA DO PROLETARIADO
A crise atual é, por um lado, uma crise financeira, e, por outro, uma crise político-institucional. A crise financeira é produto da desestabilização do regime de acumulação integral (caracterizado pela execução de políticas neoliberais, aumento da repressão policial, aumento da exploração e precarização do trabalho, entre diversos outros aspectos) que vem ocorrendo nos últimos anos no caso brasileiro. O regime de acumulação integral foi instaurado no Brasil a partir do Governo Collor, nos anos 1990, e se consolidou na década seguinte, sendo que nos últimos anos vem demonstrando um processo de desestabilização, o que é expresso por sua crise financeira e outras dificuldades de reprodução.
Ao lado disso, a disputa pelo poder entre alas do bloco dominante (composto pelas forças organizadas e conscientes a serviço do capital, ou seja, da classe capitalista) se acirra. Esse processo se iniciou desde 2013, quando as grandes manifestações populares mostraram a fragilidade do Governo Dilma. No ano seguinte esse processo se manifestou na disputa eleitoral, e em 2015 a disputa entre governistas e antigovernistas, envolvendo partidos, grupos, movimentos sociais, etc. em ambos os lados e ganhou forma na proposta de impeachment. Nesse momento, desde o processo eleitoral, criou uma falsa polarização entre governistas (a ala governista do bloco dominante, representada pelo Governo Dilma e PT), e oposicionistas (a ala oposicionista e a ala extremista do bloco dominante, representado por PSDB e organizações financiadas pelos Estados Unidos). No caso dos partidos políticos, é apenas uma disputa por quem controlará e usufruirá os privilégios de estar no aparato estatal, pois ambos representam os interesses do capital, sendo, portanto, contra os trabalhadores.
A crise financeira e a crise político-institucional se reforçam mutuamente. O Governo Dilma, devido interesses eleitoreiros, realizou uma política ambígua e indecisa, aumentando a crise. Ao lado disso, as acusações de corrupção aumentaram e foi ocorrendo uma progressiva perda de apoio do Governo Dilma. Esse ano houve um acirramento da disputa em torno do impeachment, um cerco sobre o governo Dilma dos meios oligopolistas de comunicação, poder judiciário e polícia federal.
Qual nossa posição diante desta crise? A ANT se coloca contrária à polarização estabelecida entre ala governista e ala oposicionista do bloco dominante. Nesse sentido, tanto faz qual será o partido ou presidente que efetivará políticas contra os trabalhadores. O que nos interessa é preparar os trabalhadores para combater tais políticas e os efeitos da crise financeira sobre os trabalhadores. A crise financeira para ser solucionada requer medidas voltadas para o aumento da exploração dos trabalhadores e estes só podem resistir e minimizar esse processo através de suas lutas, auto-organização, desenvolvimento da consciência revolucionária. É preciso deixar bem claro que aqueles que defendem o Governo Dilma, que efetivou diversas medidas contra os trabalhadores e planeja outras que estão sendo entendidas como necessárias, apoiam as políticas que prejudicam a maioria da população. Quem é a favor do governo é contra o proletariado, independentemente de quem está no aparato estatal, pois este expressa o interesse da classe dominante.
A luta dos trabalhadores deve ser autônoma e independente. Os trabalhadores devem se organizar e não ligar para os shows pirotécnicos das manifestações e nem pensar que esta é a única e mais eficaz forma de luta. As manifestações são apenas formas de pressão e agora assumiu o papel de medição de forças entre as alas em disputa do bloco dominante (petistas e antipetistas). Essa polarização entre forças organizadas e opostas das classes privilegiadas nada tem a ver com os interesses dos trabalhadores, que devem se opor a ambos e colocar sua posição de classe, proletária.
Nesse sentido, a ANT lança um chamado para a auto-organização dos trabalhadores, a ampliação de sua formação política e cultural, lutando, simultaneamente, contra as políticas governamentais nefastas que prejudicam os trabalhadores e pela transformação social radical. Ou seja, uma luta defensiva visando impedir a deterioração do nível de vida dos trabalhadores ao lado de uma luta ofensiva, através da auto-organização e autoformação dos trabalhadores e ações estratégicas visando a transformação total e radical da sociedade.
A forma de luta principal, nesse caso, não é a manifestação (que pode e deve ocorrer como forma secundária de luta) e sim a greve. É através da greve que os trabalhadores podem realizar uma pressão poderosa sobre as empresas capitalistas e o Estado, pois elas atingem o grande objetivo da classe dominante: o lucro. Devemos fazer brotar milhares de movimentos grevistas no país, tanto por questões específicas como também por questões gerais. Para realizar esse amplo movimento grevista, é necessário a formação de núcleos da ANT em todo o país e realizar uma ampla propaganda a favor da greve como principal forma de luta dos trabalhadores.
As greves reivindicativas são lutas defensivas que precisam ser complementadas por um planejamento de uma greve geral nacional. A greve geral nacional deve ser, ao mesmo tempo, uma demonstração de força dos trabalhadores, um processo de união do conjunto dos trabalhadores e a primeira forma ampliada de auto-organização e primeiro passa para a constituição da autogestão social.
http://ant-luta.blogspot.com.br/2016/03/comunicado-ant-02-crise-atual-e-como.html
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